terça-feira, 15 de setembro de 2009

O CÂNONE DA SÉTIMA ARTE

Seria exagerado afirmar que o cânone do cinema existe antes mesmo do cinema ser inventado, não é? Contudo, desde a primeira exibição de um filme, em 28 de dezembro de 1895, no Grand Café do Boulevard des Capucines, em Paris, o cinema foi uma arte voltada para a elite burguesa, que estava curiosa pelas invenções da ciência.

Irônico é o fato de que o primeiro curta a ser exibido foi La Sortie des Ouvriers de l'Usine, produzido pelos irmãos Louis e Auguste Lumière. A classe operária foram os primeiros atores a serem vistos na Grand Écran. Por um lado, são os “15 minutos de fama” desses ilustres desconhecidos, porém, era o olhar da bourgeoisie, que tratava de supervisionar o proletariado, como o Big Brother, de George Orwell, em 1984, não o da TV Globo.

Antes que eu me perca em digressões sem nexo novamente, demonstrarei em que medida os filmes considerados os melhores já feitos seguem um cânone próprio. Mas, para isso, será necessário recordarmos a breve história do cinema, uma arte com pouco mais de 100 anos.

1888 – Roundhay Garden Scene, de Louis Le Prince, e Traffic Crossing Leeds Bridge. São os dois primeiros filmes já feitos, tendo cerca de dois segundos de duração cada um deles.

1895 – Primeira exibição da história do cinema. Entre os filmes exibidos destacam-se: A saída dos operários das usinas Lumière e A chegada do trem na estação, produzidos pelos Irmãos Lumière.

1902 – Viagem à Lua, de Georges Mèlies. O primeiro filme de ficção-científica.

1903 – O Grande Roubo do Trem, de Edwin S. Porter. O Primeiro faroeste.

1911 – Little Nemo, de Winsor McCay. O primeiro filme de animação.
1915 – O Nascimento de uma Nação, de David Wark Griffith. O Primeiro longa-metragem.

1918 – The Sinking of the Lusitania, de Winsor McCay. O Primeiro longa-metragem de animação.

1919 – O Gabinete do Dr. Caligari, de Robert Wiene. Marco do Expressionismo alemão.

1923-24 – Paris Adormecida e Entr’acte, de René Clair. Primeiros filmes da vanguarda dadaísta.

1925 – O Encouraçado Potemkin, de Sergei Eisenstein. Um dos filmes mais revolucionários do cinema e um dos principais filmes do construtivismo russo.

1927 – O Cantor de Jazz é o primeiro filme falado. Napoleão, de Abel Gance, introduz o sistema de projeção Polyvision, de tela tripla.

1929 – Um Cão Andaluz, de Luís Buñuel e Salvador Dali, é o marco do surrealismo no cinema. É realizada a primeira cerimônia do Oscar em 6 de maio de 1929.

1939 – O Ano de Ouro de Hollywood: O Mágico de Oz,... E o Vento Levou, O Morro dos Ventos Uivantes, A Mulher faz o Homem, Duas Vidas, No Tempo das Diligências, Ninotchka, etc.

1941 – Relíquia Macabra, de John Huston, é o marco inicial do filme noir, mas o maior destaque do ano é, sem dúvida, Cidadão Kane, de Orson Welles. Inovador pelo uso sistemático da profundidade de campo, pela narrativa não-linear, pela montagem, pelos movimentos inusitados da câmera, entre outros aspectos, Cidadão Kane é o filme mais copiado e mais influente de toda história do cinema. De fato, o cinema divide-se em antes e depois do filme de Orson Welles, que é considerado por críticos de todo mundo como o melhor filme já feito.

1945 – Roma, Cidade Aberta, de Roberto Rossellini, é o primeiro e principal filme da estética neo-realista na Itália, que, apesar dos poucos recursos, inovou pela utilização de atores não-profissionais, pelo uso de cenários naturais e por retratar o cotidiano da população devastada pela guerra.

1952 – Cantando na Chuva, de Gene Kelly e Stanley Donen, representa o auge dos musicais de Hollywood.

1954 – “Uma certa tendência do cinema francês”, artigo escrito por François Truffaut, nos Cahiers du Cinéma, estabelece os alicerces da política do “cinema de autor.” Rio, 40 Graus, de Nelson Pereira dos Santos, é o precursor do Cinema Novo.

1959 – A Nouvelle Vague francesa, cujos representantes eram, em sua maioria, críticos de cinema, inova tanto pela utilização de novos recursos técnicos, como pelos poucos gastos. Em Acossado, de Jean-Luc Godard, obra-prima do movimento, foram gastos pouco mais de 90 mil dólares em sua realização. Ainda em 1959, o épico religioso Ben-Hur, de William Wyler, ganha 11 Oscar, record que só foi alcançado em 1997, com Titanic, de James Cameron, e, em 2003, com O Senhor dos Anéis – O Retorno do Rei, de Peter Jackson.

1964-65 – São produzidos dois dos mais importantes filmes do Cinema Novo: Deus e o Diabo na Terra do Sol, de Glauber Rocha, e Vidas Secas, de Nelson Pereira dos Santos, o único brasileiro considerado pelo British Film Institute como um dos 360 filmes mais importantes da história do cinema. Em 1965, Glauber Rocha publica o manifesto “Estética da Fome”, cuja idéia principal era “uma idéia na cabeça e uma câmera na mão.”

1968 – 2001: Uma Odisséia no espaço, de Stanley Kubrick, é considerado um marco no gênero ficção-científica e do próprio cinema.


1971 – Stanley Kubrick adapta o romance de Anthony Burgess sobre a violência em uma sociedade futurista e gera polêmica em todo o mundo. O filme Laranja Mecânica foi proibido em diversos países, inclusive, no Brasil.

1976 – O Império dos Sentidos, de Nagisa Oshima, é o primeiro filme “sério” com cenas de sexo explícito. No ano seguinte, Guerra nas Estrelas (1977), de George Lucas, torna-se recordista de bilheteria e é considerado um marco no desenvolvimento de efeitos especiais.

1979 – Considerado por alguns críticos como a obra-prima de Francis Ford Coppola, Apocalypse Now, clássico sobre a guerra do Vietnã inspirado no romance de Joseph Conrad, O Coração das Trevas, é, talvez, o último grande filme produzido na história o cinema. (De fato, a escolha foi arbitrária, pois, o cinema continuou a produzir bons filmes depois desta data. A opção de apontar Apocalypse Now como o último filme da história do cinema aconteceu devido a uma analogia entre o título do filme e o marco final da humanidade, o apocalipse).

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